quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Leonel Brizola, Lula, o PT e Marina


Marina Silva é legal. Marina Silva é correta. Marina Silva foi analfabeta até os 16 anos e hoje fala um português corretíssimo - ao contrário do Presidente da República.


No entanto, por que Marina Silva não me empolga? Pensei, pensei e cheguei a uma conclusão: porque eu fui Brizolista !!!
 
 
Na época da ditadura militar, só havia duas posições possíveis: a favor ou contra. Indiferença era conivência. Havia medo, coragem e esperança. Cresci neste ambiente. Fiz-me a favor do contra. Leonel Brizola (foto) personificava tudo o que um jovem como eu ansiava.
 
 
Na década de 80 do século passado, eu estudava na PUC e frequentava os pilotis da faculdade carregando livros e trajando jeans, suspensórios, boot, bótons da banda punk hardcore Dead Kennedys, de Fidel Castro e lenço maragato com bótom do PDT no laço.
 
 
Sim, eu era uma figuraça. E adorava isso. Depois de tanto tempo, mal ou bem, mesmo sob uma ditadura de direita, eu podia me expressar - e estava na idade da afirmação total.
 
 
E tome provocação: na PUC, símbolos brizolistas eram odiados por católicos, judeus (sim, existiam muitos judeus na universidade católica), direitistas, padres, playboyzinhos, budistas, comunistas, conservadores e principalmente pelos petistas.
 
 
Eu não conseguia entender, mas o principal adversário do PDT do Brizola era o PT. Os estudantes petistas odiavam o líder pedetista tanto ou mais do que os militares que estavam no poder e que se opunham à democracia (e ao Brizola).
 
 
Os petistas se consideravam os mais "puros". Eles não costuravam alianças. Eles não eram populistas. Eles tinham um excelente programa de governo para o Brasil.



Eles possuíam nos seus quadros brilhantes acadêmicos, artistas, comunistas, revolucionários, a vanguarda, os militantes esclarecidos, socialistas, movimentos sociais, sindicatos anti-pelegos, jovens com esperança.
 
 
Nós, os brizolistas, éramos um bando de fanáticos atrás de um líder popular. Eu tinha inveja deles. Eu me considerava um punk comunista que sonhava com tudo o que eles, os petistas, já possuíam em termos de partido político, para ser somado ao nosso líder - que era muito mais carismático e por isso, ao contrário deles, já havia conquistado a massa.
 
 
Eles estavam cercados por intelectuais e estudantes, mas ainda sonhavam com o povo. O PT era um partido nanico. Competia e não ganhava. Seus jovens militantes da classe média exibiam estrelinhas vermelhas na lapela e promoviam festas hipongas com muita Janis Joplin e bata indiana. Eram vanguarda na política e retrô na cultura e estética (já naquela época).
 
 
Eu achava essa gente insuportável. Bichos grilos arrogantes em nome do povo.
 
 
Entretanto, um brizolista tinha mais com o que se preocupar do que com o nanico PT: militares, o Governo Federal, a mídia em geral, a classe dominante, reacionários diversos, a Rede Globo daquela época... Um massacre que era desafiado pela massa, que se mantinha leal ao "Engenheiro".
 
 
Certa vez, seguia para a PUC no meu querido Opala (conhecido pelos meus amigos como "Brizopala", por causa de um adesivo vermelho com o nome do político gaúcho no vidro traseiro).
 
 
Em Ipanema, um guarda fez sinal para eu parar. Pediu os meus documentos e vendo que estava tudo certo, me liberou; mas, antes, me disse em um tom sinistrão: "quando você estiver com esse adesivo aí no vidro, procure andar com a documentação toda em dia. Vai ser melhor pra você...".
 
 
Enquanto isso, o Governador Brizola determinava a distinção entre o tratamento dado pela polícia aos bandidos e aos trabalhadores que moravam nas favelas; além de estatizar linhas de ônibus ineficientes e autorizar que uma certa linha exclusiva cruzasse o Túnel Rebouças, para ganhar tempo e permitir que os trabalhadores de Ipanema e Leblon pudessem dormir um pouco mais todos os dias.
 
 
Revolta geral: como ficariam os dois bairros, as praias cariocas com aquela "gentalha" nos fins de semana? E tome de discussão nos bares da Zona Sul e na PUC. E tome de porrada no Brizola.
 
 
Uma vez, ouvi um indignado empresário - amigo e cliente do meu pai - dizer que com os Cieps - os famosos Brizolões - muitos pais seriam desrespeitados pelos filhos, que diriam: "não devo nada a você. Quem pagou a minha educação foi o Brizola."
 
 
Caro(a) internauta, se você tem pouca idade, não deve imaginar o quanto Leonel de Moura Brizola foi atacado e perseguido. A imprensa pesquisava, o SNI vasculhava, nada se descobria; então, mentiras eram divulgadas ("ele fugiu para o Uruguai vestido de mulher; antes de ir, ele pisou na bandeira brasileira..."), mas o povão continuava ao lado dele.
 
 
Os íntegros petistas se aliavam a todo tipo de ataque (viesse de quem viesse) ao Governador Brizola. Eu achava esta atitude uma burrice. Afinal, tínhamos um inimigo em comum: a ditadura militar brasileira. Tirando este fato, eu os admirava em segredo.
 
 
O PT seguia o seu curso solitário e íntegro: criou problema para assinar a Constituição de 1988, motivo de luta de tantos e do Dr. Ulysses Guimarães, e antes ainda se recusou a votar em Tancredo Neves em uma eleição indireta - que se apresentava como a única maneira de expulsar os militares do poder e retomar a democracia.
 
 
Era absurdo, era irracional era burro até, mas era radical e apontava para uma reserva moral com futuro. "No futuro, quando eles crescerem, teremos homens e mulheres íntegros a comandar o país" - eu pensava.
 
 
Tempos depois, uma diferença mínima de votos, que quem sabe algum dia se descubra como irregular, e o Lula vai ao segundo turno com o Collor. Uma vergonha o desempenho do petista nos debates. Collor confiante sem ter que enfrentar a verve do pedetista.
 
 
Brizola apóia Lula no segundo turno das eleições em troca de apoio no pleito seguinte para o Governo do Rio de Janeiro. O PT rasga o acordo e lança candidatura própria, que foi arrasada pela eleição no primeiro turno de Leonel Brizola.
 
 
Ali, foi um lugar e um momento feliz para nós brizolistas: um segundo mandato do "Engenheiro" no Estado do Rio. Um "não rotundo" a tudo e a todos que atrasavam o Brasil.
 
 
No entanto, muito tempo depois, o PT chegou ao poder, Brizola morreu e o Deputado Roberto Jefferson abriu a boca.
 
 
Minha primeira preocupação foi com a minha irmã mais nova. Explico: ela passou toda a vida a dividir comigo o sonho de ver a esquerda brasileira no poder. Não seriam alguns canalhas, que iriam desmoralizar um sonho que eu ajudei a construir nela.
 
 
Procurei explicar a minha irmã que "trintinha" no bolso de alguns parlamentares corruptos sairia até barato, porque garantiria a aprovação - num congresso travado - das medidas necessárias para o bem da maioria, blá, blá, blá.
 
 
Mas à medida que Bob Jeff abria a boca e outros cantavam com ele, as sujeiras apareciam. Apareceram. E foram muitas. E foi um mar de lama. Uma sujeira. Uma podridão!
 
 
E eu que admirava tanto o José Dirceu, o gênio da esquerda brasileira... ...o José Genoíno, o galã de fronte alta da esquerda do país... Que nojo!
 
 
Chega! O Brasil morreu pra mim! Fui ler e reler. Chega de Marx! Freud é que é o Gênio da Raça! Chega de comunismo e comunistas!
 
 
Novos escândalos de corrupção surgiram (além do anterior e assustador Caso Celso Daniel que ganhou mais luz). Hoje, qual é a diferença entre o PT, o PMDB e o PSDB? Qual é a política de educação do governo Lula? Brizola era populista? O que é o Bolsa Família?
 
 
Por que depois da participação ativa de artistas, intelectuais e acadêmicos para se vencer o preconceito dos reacionários contra um presidente analfabeto, o Ministério da Cultura só tem um orçamento maior do que o da Pesca?
 
 
A decepção com o PT acabou com a militância espontânea. Hoje, só pagando aqueles infelizes que distribuem panfletos e, melancólicos, agitam bandeiras.
 
 
Os sindicatos estão calados. Os jovens, os estudantes nos grêmios estudantis, nos DCEs das faculdades não se manifestam mais. Os estudantes, repito: os estudantes ("profissionais") estão atados e calados.
 
 
A corrupção está no DNA do brasileiro. Ela é cultural no Brasil. Se o Plano Real está sendo corretamente mantido, eu compro eletrodomésticos e tenho crédito nas Casas Bahia, que roubem à vontade! Sempre se roubou. Esta corrupção é diferente: ela é de esquerda. Uma corrupção ideológica.
 
 
Voltei a ler sobre a colonização brasileira. A história é a psicanálise dos povos.
 
 
Marina Silva é legal. Marina Silva é correta. Marina Silva foi analfabeta até os 16 anos e hoje fala um português corretíssimo.



Mas não contem mais comigo.



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