terça-feira, 14 de agosto de 2012

Jogos Olímpicos - Londres 2012


Quando eu era pirralho, costumava desprezar as Olimpíadas por preferir o futebol. 


Eu acompanhava futebol o ano inteiro, conhecia os clubes, os jogadores, assistia os campeonatos e, por tudo isso, não me sentia à vontade com modalidades esportivas que só apareciam na mídia brasileira de quatro em quatro anos nos Jogos Olímpicos.


Eu era acometido por uma espécie de síndrome de entendido (no sentido ortodoxo do termo) em futebol, e assistir e torcer por alguém ou alguma equipe nas Olimpíadas era quase como trair o futebol, que eu acompanhava e me acompanhava o ano inteiro.


Em 2004, abandonei essa grande tolice e assisti pela TV com muito interesse os Jogos Olímpicos disputados em Atenas. Uma estreia (pra valer) em Olimpíadas na Grécia se fez cheia de sentido para mim. Gostei muito de quase tudo, especialmente das modalidades esportivas que eu não conhecia. 


Tenho uma recordação afetiva especial pelas finais de tênis (que já era o meu segundo esporte preferido na época). As conquistas dos chilenos Nicolás Massú e Fernando González ficarão para sempre na minha memória. 


As duas primeiras medalhas de ouro do Chile em Olimpíadas: Massú na final de simples e na de duplas com Fernando González (que ficou com o bronze na simples). Eu já era fã do estilo guerreiro da dupla.  


Foram duas finais com viradas emocionantes no mesmo dia. Lembro-me que o SporTV (depois de horas de cobertura) acabou abandonando a transmissão de uma das partidas (não me lembro qual) e eu tive que correr para a internet.


Em Pequim 2008, eu trabalhava no Globoesporte.com junto a uma talentosa e competente equipe liderada pelos jornalistas Gustavo Poli e Pedro Só. Apesar do trabalho intenso, foi bem legal trabalhar, aqui no Rio, de madrugada por causa do fuso horário de Pequim. 


Naquele ano, pude reviver a experiência vivida na Fluminense FM onde encarei diversos turnos na locução, mas gostava especialmente de passar as noites e madrugadas entretendo os ouvintes.


Nessa edição de 2008, no tênis feminino, na categoria musa, a minha atleta preferida, a russa Elena Dementieva, conquistou a medalha de ouro mesmo com o seu saque deficiente - compensado por uma ótima devolução com bolas fundas e pesadas. 


mais bonita atleta de todos os tempos, para mim, exibiu o seu belo sorriso vitorioso no ponto mais alto do pódio.  


Depois de contaminado pelo espírito das Olimpíadas não perdi nem os Jogos Olímpicos de Inverno (pelo SporTV), que descobri na edição Turim 2006 e foi onde conheci o curling - provavelmente o esporte preferido dos mods (perdoem-me, não resisti a essa piada pronta). Virei fã da modalidade.


Como os textos do meu espaço dispensam pirâmides invertidas e limites de toques, só agora aparecerá aqui "Londres 2012": a minha edição preferida dos Jogos Olímpicos até agora.


Também pudera, uma edição de Olimpíadas que na cerimônia de abertura apresenta uma parte considerável da trilha sonora da minha vida...


Estiveram lá (muitos em pequenas vinhetas): The Jam, Kinks, Clash, Specials, Oasis, Blur, Led Zeppelin, The Who, Arctic Monkeys (com uma versão demolidora de "Come Together" dos Beatles), Happy Mondays, The Verve, Bowie, Radiohead, Prodigy, Coldplay, não, Coldplay eu não gosto, Sex Pistols com "Pretty Vacant" (uma das mais longas) e, o mais incrível, "God Save The Queen"!!!


Só entrou a parte do "God save the Queen", o verso seguinte "The fascist regime" foi sumariamente cortado, ou melhor, editado. 


Foi bacana constatar que o establishment mais do que se apropriar da rebeldia de uma forma de expressão artística, a reconhece como parte da sua cultura (com um certo orgulho), embora não a queira dentro da sua sala, preservando assim -involuntariamente - o seu espírito rebelde.


Ou seja, antes mesmo da sua primeira competição esportiva, "London 2012 Olympic Games" já tinham conquistado um fã aqui no Leblon - ou um torcedor, na versão da minha amada e sofisticada língua portuguesa.


Revolução Industrial, Isambard Kingdom Brunel, Winston Churchill, Tim Berners-Lee (estranhamente, não conheço nenhum internauta que o conheça), Paul McCartney, toda a cena envolvendo a Rainha e James Bond, com o espetacular e bem humorado desfecho, tudo e todos fizeram parte de um grande espetáculo.


Só faltou citarem Jethro Tull - o agricultor, não a banda (seu líder, o escocês Ian Anderson, provavelmente declinaria do convite, como fizeram alguns artistas).


Uma surpreendente pira olímpica que privilegiou vários atletas foi um contraponto aos dois mascotes possivelmente mais feios da história - bem diferentes do simpático ursinho Misha das Olimpíadas de 1980 em Moscou. 


As competições esportivas começaram, eu me programei e me aprazi com os sete canais em HD. ESPN, Record e SporTV (em ordem alfabética) fizeram uma cobertura excelente. 


O mico de ouro ficou com o meu querido jornal O Globo, que no caderno de esportes estampou uma capa ridicularizando a falta de medalhas da Grã-Bretanha ("Dad, where's the gold?" - "Pai, onde está o ouro?"). 


Dentro do caderno um texto com tom político citava algo como "o ouro roubado pelo Império Britânico ao logo da História" e se regozijava com o ouro das medalhas que não era conquistado pelos atletas britânicos até aquele momento. 


Um ridículo só comparável ao ato de se cobrar de Michael Phelps a entrega das suas medalhas aos países da América do Sul, como forma de repará-los por terem sido vítimas de ditaduras militares patrocinadas pelos Estados Unidos (entre outros males), por exemplo.


Nos anos 70 do século passado, um texto assim (provavelmente no JB) seria até interessante, embora o atleta não tenha nada a ver com isso, mas hoje em dia é só ridículo.


No final, foi o que se viu: os atletas da terra de Billy Bragg conquistaram 29 medalhas de ouro, 17 de prata, 19 de bronze e o terceiro lugar no quadro de medalhas.


O tal caderno também "inventou" manchetes passivas e frias, onde o factual do dia anterior aparecia como em um resumo de uma revista semanal. Quem sabe esse tom venha a ser adotado na próxima Copa do Mundo? Seria uma boa alternativa à histeria que toma conta da mídia nesse evento.


O Brasil foi o quarto colocado das Américas no quadro geral de medalhas e me deu boas alegrias. O fato de eu nunca ter ouvido falar de Arthur Zanetti, só aumenta o mérito do atleta paulista, que trabalhava sem cobertura da mídia. 


Foi a maior quantidade de medalhas conquistadas pelo Brasil em Olimpíadas, mas um evento do porte dos Jogos Olímpicos não pode ser ignorado, menosprezado ou ficar refém do sucesso ou não do Brasil.


O maior evento esportivo do mundo é uma tremenda atração para todas as pessoas que gostam de esportes - independentemente do resultado dos nossos atletas.


"Brasileiro não gosta de esporte, brasileiro gosta de ganhar" é algo tão estúpido, que se fosse aplicado pelas plateias locais aos torneios de Wimbledon e Roland-Garros, essas competições já não existiriam mais. 


Como se sabe, no simples masculino, um britânico não se sagra campeão em casa desde 1936 e um francês não comemora um título no Aberto da França desde 1983.


Falando em tênis, nos jogos de Londres 2012, tivemos partidas espetaculares como as protagonizadas por Roger Federer e Juan Martín del Potro (Suíça x Argentina), em uma semifinal, e a final entre Andy Murray (GB) e Roger Federer. Dois partidaços com muito talento e emoção em quadra.


Também foi sensacional a final de vôlei de praia masculino entre a dupla brasileira Alison e Emanuel (39 anos!) e o duo alemão, que ganhou a medalha de ouro. 


Os brasileiros jogaram muito (totalizaram 56 contra 55 pontos), mas os alemães Brink e Reckermann sacaram melhor e mereceram a vitória, assim como os brasileiros também devem ser parabenizados.


Toda festa será pouca, para comemorar a medalha de ouro do volêi feminino brasileiro em partida épica (!) contra os Estados Unidos. Foi sensacional!!! 


Aliás, as Olimpíadas são o evento esportivo no qual as mulheres são tão importantes quanto os homens. 


É uma atração a mais poder ver atletas mulheres de todo o mundo no seu esplendor em luta por medalhas para o seu país. 


No feminino, assisti a várias partidas de hóquei sobre a grama, vôlei de praia e indoor, provas de atletismo, natação, judô, e etc.  


[no futebol, só assisti as partidas da modalidade feminina. Saturado desse futebol vagabundo que é jogado por aqui, já destronei esse esporte do espaço que ocupava na minha vida nos tempos de pirralho]


Talento e beleza não faltaram as atletas Zara Dampney da Grã-Bretanha (vôlei de praia), a cubana Yarisley Silva (prata no salto com vara), Kaylyn Kyle do time de futebol do Canadá (bronze), a brasileira Sheilla do vôlei (ouro) e Sophie Polkamp da equipe de hóquei da Holanda (ouro), entre inúmeras outras. 


A fera e bela pugilista Katie Taylor confirma o papel desempenhado pelo esporte junto à identidade nacional. A atleta foi a porta-bandeira da Irlanda e levou ao delírio centenas de torcedores do seu país na arena onde ocorreram as lutas. 


Katie Taylor que, se não me falha a memória, entrou no ringue pelo menos uma vez ao som da banda irlandesa Thin Lizzy, ganhou a única medalha de ouro da Irlanda nos Jogos e confirmou a esperança da sua torcida, que foi sempre maioria no local onde ocorreram as lutas. 


Será que algum dia teremos uma atleta que será tão idolatrada por aqui, quanto os atletas homens?             


Não gostei tanto da festa de encerramento quanto da de abertura. Para mim, o solo de Brian May é sério candidato a pior solo de guitarra de todos os tempos. 


A presença do descartável Take That foi compensada pelas lendas Ray Davis e o ex-Monthy Python Eric Idle, pelo Madness, Nick Mason, Mike Rutherford e pelo cover phoda de "Pinball Wizard" com o Kaiser Chiefs em clima de "Quadrophenia" - o filme -, além do Beady Eye e o encerramento triunfal com The Who. 


A parte brasileira da festa também foi legal. O lugar comum dos estereótipos foi temperado com o carisma do gari Renato Sorriso e a beleza e graça da top gaúcha Alessandra Ambrósio. 


O gonçalense, jinglista e empresário de cachaça Seu Jorge foi o malandro carioca, já que "aquela tal malandragem não existe mais".


O talentoso e gente fina BNegão conseguiu uma admirável e invejável viagem com tudo pago e Marisa Monte estava muito bonita em uma aparição lateral, que sempre me faz rir. [lembro-me de uma cena com urubus no filme "Ishtar" de 1987, que eu só fui assistir porque tinha a Isabelle Adjani no elenco]


Quem organiza uma grande festa precisa dedicar uma atenção especial à música e foi o que se ouviu e viu nas cerimônias de abertura e encerramento das Olimpíadas de 2012. 


A Grã-Bretanha finalmente mostrou orgulhosamente ao mundo o que os seus jovens branquelos fizeram a partir do mais influente gênero da música do nosso continente: o blues.   


Londres 2012 foi um grande evento, que não pode ser minimizado ou ignorado ao sabor de questões contratuais envolvendo direitos de transmissão.


Caso contrário, correremos o sério risco de os Jogos Olímpicos perderem em importância para um musical assistencialista, um "Criança Esperança", por exemplo. 



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