terça-feira, 9 de outubro de 2012

Cariocas Derrotam Capitão Nascimento


Quando o filme "Tropa de Elite" foi lançado, eu trabalhava na editoria do Jornal dos Sports e fui, praticamente, obrigado a assistir a uma cópia pirata que circulou pela redação.


O DVD passava de mão em mão e eu resistia. 



Não, não se tratava de uma atitude ética da minha parte contra a pirataria. Apenas, na época, não estava no clima do filme. Considerava a temática da obra um verdadeiro show de realidade, com o qual eu já convivia e driblava todos os dias - inclusive nas minhas idas quase que diárias à redação. 



A minha resistência foi derrotada, quando todos, todos da redação já tinham visto o filme e um clima de histeria coletiva tomou conta do ambiente. Fui o último a levar para casa o tal DVD. 



Já conhecia falas e cenas inteiras do filme antes de assisti-lo. A histeria se caracterizou nas brincadeiras, conversas, citações de falas, diversos memes do filme - que eram compartilhados todos os dias e assistidos entre gargalhadas - e recordações de cenas que eram constantemente relembradas.



Se eu não assistisse o DVD, o meu relacionamento com os colegas de trabalho (de diferentes funções e classes sociais) seria prejudicado. 



Assisti "Tropa de Elite". Achei interessante um filme sobre drogas ter o ponto de vista dos agentes da repressão (o que não é comum), entendi a opinião de muitas pessoas que criticaram o fato da obra, praticamente, apontar os usuários de droga como os principais responsáveis pelo tráfico, achei a direção correta e gostei muito do desempenho de todo o elenco.



Não li o livro "Elite da Tropa" de Luiz Eduardo Soares, Rodrigo Pimentel e André Batista, que deu origem ao filme, mas, pelo que li na imprensa na época do lançamento do livro, as abordagens foram muito diferentes. 



Por causa das denúncias de tortura, os autores do livro, se não me engano, evitaram a exposição. No filme do diretor José Padilha, a topa de elite foi alçada à condição de um grupo de heróis.



Três anos depois, lançaram "Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora é Outro". 



A histeria que eu verifiquei na redação e fora dela, dessa vez se deu dentro da sala de cinema com gritos, vários momentos de aplausos durante a exibição do filme e, novamente, brincadeiras, conversas, citações, memes e muitas discussões acaloradas nas quais todos (eu escrevi 'todos') endossavam o ponto de vista do promovido capitão Nascimento e do professor Diogo Fraga.



Recebi um convite e fui a uma palestra na qual estiveram presentes o ator Wagner Moura e o deputado estadual Marcelo Freixo (a inspiração para a personagem do professor Diogo Fraga), que foram tratados com honras diplomáticas e alguma histeria (novamente ela - não se pode negar que um intenso frenesi tomou conta dos dois filmes).



Também estive presente em botequins e festas com porteiros e doutores de diferentes idades, que substituíam a frase sem sentido (para mim) "só Jesus mesmo", por "só um capitão Nascimento mesmo pra dar jeito nessa canalha!". 



Vieram as eleições municipais e o deputado Marcelo Freixo foi candidato a prefeito da cidade do Rio de Janeiro. As inevitáveis pesquisas pré-eleitorais apontaram o candidato do PSOL com um percentual de intenção de voto muito baixo. Fato que foi confirmado com o resultado final da eleição.



Marcelo Freixo foi derrotado em 96 das 97 zonas eleitorais da cidade do Rio de Janeiro, contabilizando apenas 28% dos votos válidos - o candidato não chegou a atingir nem um milhão de votos.



Por mais que os cariocas estivessem satisfeitos com a administração do prefeito Eduardo Paes (um prefeito que dialoga com a imprensa e seus colunistas), e por isso optado pela sua reeleição, como explicar (?) a tão baixa votação de um parlamentar ainda incólume a acusações comprometedoras (o que não é pouca coisa no Brasil), envolvido na perigosa luta contra o crime e a corrupção, e inspirador de uma personagem integrante de uma dupla dinâmica motivadora de imensa comoção nacional?



O fato de tal candidatura ter estado em baixa nas pesquisas pré-eleitorais é um forte indício de que as tais poderosas contribuições de campanha não apostaram nela (ao invés do raciocínio contrário), mas aí reconheço que é ser otimista demais com o raciocínio da maioria e nem eu posso provar essa minha conjectura. 



Em uma conclusão com pouca reflexão, mas muita observação aos cariocas, penso que carioca gosta de festejar, de seguir a maioria (e aí o sucesso sugestivo das pesquisas eleitorais), de emoção à razão e, principalmente, de modismo fugaz. 



Carioca gosta de onda - onda que não se vê nas praias do Rio. 



Certa vez, em um bate-papo, perguntei ao colega Mauro Trindade a que ele atribuía o sucesso dos filmes "Tropa de Elite" e ele me respondeu de imediato: "Alexandre, trata-se de um filme americano com gíria carioca". 



É, querido Mauro, infelizmente foi só isso mesmo. 



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